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sábado, 2 de novembro de 2013

"Um Estado melhor", guião para elaborar um documento incompetente

A leitura do documento "Um Estado melhor" é importante, não pelo que representa objectivamente, mas pelos significados periféricos que a sua apresentação comporta. Foi apresentado na véspera da votação do orçamento de estado para 2014, pelo vice-primeiro-ministro sem a presença do primeiro-ministro, nove meses depois de ter sido anunciado, mais de dois anos após a tomada de posse do governo, menos de 1 ano antes do prazo marcado para terminar o período de vigência do programa de ajustamento económico e financeiro e a uma distância ligeiramente inferior em relação às eleições europeias.

Paulo Portas apresentou-o como um programa político para as próximas eleições e procurou atrair o ps para um eventual entendimento futuro. O psd pode perder as próximas eleições legislativas e o ps pode não ter maioria absoluta. O cds continuará na esfera do poder.

O texto do documento mistura, em doses não proporcionais, o estilo do panfleto político com o do programa partidário para duas legislaturas, tudo isto condimentado com a apresentação pública efectuada por um político que migrou do jornalismo e manipula as consciências de forma brilhante.

Vejamos agora uma proposta concreta: a proposta para plafonamento das pensões e das reformas. Não tem novidade e, muito menos, actividade inventiva. Marques Mendes tinha avançado com esta proposta quando o ps fez a reforma da segurança social. A insustentabilidade financeira da proposta era resolvida, na altura, com a emissão de 9 mil milhões de dívida pública! Mas o guião afasta a possibilidade de avançar com esta reforma porque exige, como condição, que a taxa anual de crescimento da economia seja de 2%. Portanto, será uma reforma a fazer depois de outras reformas. E quais serão estas reformas? Como o guião não tem calendarização ou metas, ninguém sabe.

A reforma do sistema educativo passa por "cheque ensino", mas com cuidado, e pelo estabelecimento de contratos de gestão de escolas públicas com os professores. Em relação ao primeiro, a expressão não representa nada a não ser que se detalhem os mecanismos subjacentes. No que diz respeito ao segundo, concordo com o princípio das experiências piloto. Mas não é esta a essência do problema. Não queremos um guião de medidas para cortar a despesa pública na educação. Para isso já temos o orçamento de 2014 e o memorandum de entendimento com a troica. 

Aquilo que o país precisa é um sistema educativo que contribua para diminuir a taxa de desemprego. A taxa de desemprego natural é de 10% e a taxa de desemprego é de 17%. Não é suficiente educar melhor para que as pessoas encontrem trabalho, é preciso que a economia cresça. Mas a educar é também preparar para a actividade económica que temos e que viremos a ter. No caso contrário, estaremos a educar para a imigração.

O exemplo da educação estende-se a todos os outros sectores que são abordados neste guião.

Não são apenas as fontes, as abreviaturas e os acrónimos; a letra arial de tamanho 16 que dá origem a mais de cem páginas quando tudo cabia em trinta. É a superficialidade, a falta de cuidado intelectual, enfim, a incompetência.



           

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