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domingo, 26 de outubro de 2014

Proposta de lei do orçamento para 2015



A proposta de lei do orçamento de Estado para 2015 foi entregue na Assembleia da República para discussão pelos grupos parlamentares. Contudo, a distracção mediática com o presumível texto da proposta de lei começou muitas semanas mais cedo. E foi útil ao governo estipular as coisas desta forma. Utilizando a informação tornada pública nos meios de comunicação e nas redes sociais apenas como aparência, o orçamento de 2015 diminuirá a carga fiscal sobre os lucros das empresas (Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas - IRC), sobre os agregados familiares com filhos (Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares - IRS) e sobre os reformados e pensionistas (contribuição extraordinária de solidariedade - CES). Por sua vez, propõe-se que os impostos sobre os combustíveis e sobre as bebidas alcoólicas aumentem e que, no ano de 2016, caso a cobrança de IRS em 2015 ultrapasse um valor preestabelecido, será devolvida uma parte da CES. Como cereja no topo das cobranças, a cláusula de salvaguarda cairia e, consequentemente, o Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) subiria de forma generalizada. 
Esta paisagem fiscal teve (e tem) a grande virtualidade de permitir interpretações variegadas pelas diversas forças políticas e sensibilidades do governo: não é um orçamento de austeridade porque existem impostos que baixam; não é um orçamento eleitoralista porque existem impostos que sobem, outros que ficam condicionados e a carga fiscal total não desce. Em rigor pode dizer-se, subtilmente, que este orçamento será sempre, intimamente, eleitoralista para uns e para outros. Os primeiros porque acham que conquistam eleitorado e sobrevivência se aliviarem a carga fiscal e os segundos porque acham que conquistar eleitorado no centro e à direita é manter sinais de exigência orçamental e requisitar a respectiva coerência.
A oposição irá votar contra esta proposta de orçamento. O ps não perderia a oportunidade de se encostar no centro e na esquerda e, por isso, de forma consistente, reivindicará crescimento, investimento e alívio da austeridade.
Os portugueses merecem mais, porque dizer que merecem um pouco mais, sugere uma ironia que o leitor não compreenderia.
Portugal continua numa situação de emergência. O alívio financeiro que o país tem beneficiado decorre, acima de tudo, da intervenção do Banco Central Europeu (BCE), levando à redução das taxa de juro das obrigações soberanas dos países do sul da Europa.
A construção de uma proposta de orçamento para um ano eleitoral não tem de seguir uma cartilha eleitoralista. No ano de 2015 teremos uma grande imponderabilidade política (eleições legislativas e preparação das eleições presidenciais) mas também económica e financeira. A zona do euro e a União Europeia entrarão em recessão ou terão crescimentos anémicos e, portanto, a nossa economia não beneficiará do efeito mobilizador dos sectores com características eminentemente exportadoras. Também o resto da economia mundial mostrará mais receio que confiança. Ademais, o Grupo Espírito Santo e a Portugal Telecom agonizam sob crises convergentes.
Desta forma, parecer-me-ia mais aconselhável uma proposta de orçamento atípica e em ruptura com o habitual contexto de curto prazo, que considerasse uma reforma do estado, a manutenção do actual nível de austeridade durante mais algum tempo e o início de conversações sobre a renegociação da dívida pública.      

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