O país converge no sentido da
mediocridade. O espaço de realização deste país tem encolhido de forma
perceptível. A forma como ocorreu a perda do império fechou-nos dentro da
europa, onde somos pequenos e insignificantes. A nossa elite compromete-se,
diariamente de forma empenhada, em tornar-nos ainda mais irrelevantes ao procurar sempre as
pequenas soluções que circunscrevem a História a uma pequena sucessão de dias.
Vejamos a posição dos grandes
partidos portugueses perante a crise financeira e económica que se instalou
desde 2008 e que se materializou em Portugal sob a forma do resgate financeiro
conduzido pela troica (banco central europeu, comissão europeia e fundo
monetário internacional): o psd e o cds defendem o programa de ajustamento
económico e financeiro (paef) como sendo o seu programa de governo. Julgo que
têm, inclusivamente, uma pequena inveja pelo facto de não terem tido a coragem
de transformar o paef nos seus programas partidários. Claro está que o
cds reivindica para si (pequenas) diferenças que servem para tentar salvaguardar o seu
eleitorado em futuras eleições legislativas.
O ps, que assinou o acordo com a
troica a contragosto depois de ter sido derrotado por uma aliança antinatural
entre a direita e os partidos à sua esquerda, lá vai dizendo que o governo foi
além do memorandum (isto é, do paef): Encontra neste facto a razão pela qual tudo correu tão mal nos últimos três anos. Uma
análise mais rigorosa dos acontecimentos permite aceder a uma realidade diferente e,
infelizmente, menos fraturante.
José Sócrates ganhou com maioria absoluta as
eleições legislativas antecipadas de 2005 e deu início a um programa reformista
que pretendia desincrustar alguns interesses adquiridos que capturavam a economia
e o estado. Reviram-se as leis laborais e deu-se consistência à reforma da
segurança social. O primeiro governo socialista de maioria absoluta governou ao
centro e introduziu o conceito de austeridade: o objetivo fundamental era o
cumprimento simultâneo do limite dos 3% para o défice público e a reanimação de
uma economia anémica pela entrada no euro e pela globalização. Apanhado pela
crise financeira de 2007-2008 e pela incapacidade europeia de orquestrar uma
resposta, o governo socialista, minoritário, que entretanto tinha saído das
eleições legislativas de 2009 acabou a praticar um programa de austeridade mais
intensivo que assumiu os traços mais dramáticos no paef.
Portanto, o ps sempre
defendeu e praticou as políticas de austeridade inspiradas nos tratados
europeus e mais ou menos impostas pela comissão europeia e pela Alemanha por
um lado, e pelo pensamento económico, científico e académico, predominante, por outro.
Mais: as alternativas do ps às medidas do paef, independentemente das correntes
internas em que estão filiadas (seguristas, costistas, socratistas), apresentam
três grandes traços: primeiro, distinguem-se pela intensidade das medidas de austeridade
e de ajustamento, em segundo, pela adesão a soluções do tipo messiânico (ex.:
Hollande) e em terceiro, pela semiótica que as acompanha, a qual traduz
a contrariedade na sua aplicação. Dito de outra forma, o ps aplicará todas as medidas que a
comissão europeia e a Alemanha indicarem, sob protesto, contrariado e utilizando
um vocabulário mais sofisticado.
O partido comunista (e o bloco de
esquerda, já agora) nunca aplicaria um programa de austeridade como aquele que
está contido no paef/memorandum. A austeridade teria de ser estendida aos
grupos económicos, instituições bancárias e detentores dos contratos das parcerias
público-privadas. Por isso, o pcp nunca terá de assumir as suas opções políticas a
partir de um lugar de poder, porque nunca assumirá as responsabilidades governativas. Tem a vida facilitada: pode continuar a resistir a
partir de uma posição de superioridade moral perante o povo. Mas esta posição
não terá qualquer consequência prática.
O povo
português já percebeu o que está em causa e votou nas últimas eleições em
conformidade. O que seria verdadeiramente diferente neste contexto histórico
seria criar as condições políticas para reestruturar a dívida pública
portuguesa e dos países do sul da europa mantendo simultaneamente políticas de
austeridade de elevada intensidade, mas justas do ponto de vista distributivo.
Para as gerações actuais e futuras, é absolutamnete necessário a
obtenção de resultados orçamentais nulos ou positivos e, simultaneamente, a
reestruturação da dívida pública através de uma aproximação multilateral ou bilateral.
Em alternativa, temos a saída do euro que continuará a exigir políticas de
austeridade violentas e capacidade política superlativa.
Em resumo, as elites políticas e
económicas portuguesas deveriam estudar de forma mais racional a actual posição
de Portugal no mundo e rejeitar, tanto a assimilação acrítica dos pontos de
vista do directório europeu, como a bonomia das soluções fáceis, ou facilmente
vendáveis.
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