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segunda-feira, 9 de junho de 2014

Pessimismos lusitanos



O país converge no sentido da mediocridade. O espaço de realização deste país tem encolhido de forma perceptível. A forma como ocorreu a perda do império fechou-nos dentro da europa, onde somos pequenos e insignificantes. A nossa elite compromete-se, diariamente de forma empenhada, em tornar-nos ainda mais irrelevantes ao procurar sempre as pequenas soluções que circunscrevem a História a uma pequena sucessão de dias.

Vejamos a posição dos grandes partidos portugueses perante a crise financeira e económica que se instalou desde 2008 e que se materializou em Portugal sob a forma do resgate financeiro conduzido pela troica (banco central europeu, comissão europeia e fundo monetário internacional): o psd e o cds defendem o programa de ajustamento económico e financeiro (paef) como sendo o seu programa de governo. Julgo que têm, inclusivamente, uma pequena inveja pelo facto de não terem tido a coragem de transformar o paef nos seus programas partidários. Claro está que o cds reivindica para si (pequenas) diferenças que servem para tentar salvaguardar o seu eleitorado em futuras eleições legislativas. 

O ps, que assinou o acordo com a troica a contragosto depois de ter sido derrotado por uma aliança antinatural entre a direita e os partidos à sua esquerda, lá vai dizendo que o governo foi além do memorandum (isto é, do paef): Encontra neste facto a razão pela qual tudo correu tão mal nos últimos três anos. Uma análise mais rigorosa dos acontecimentos permite aceder a uma realidade diferente e, infelizmente, menos fraturante. 

José Sócrates ganhou com maioria absoluta as eleições legislativas antecipadas de 2005 e deu início a um programa reformista que pretendia desincrustar alguns interesses adquiridos que capturavam a economia e o estado. Reviram-se as leis laborais e deu-se consistência à reforma da segurança social. O primeiro governo socialista de maioria absoluta governou ao centro e introduziu o conceito de austeridade: o objetivo fundamental era o cumprimento simultâneo do limite dos 3% para o défice público e a reanimação de uma economia anémica pela entrada no euro e pela globalização. Apanhado pela crise financeira de 2007-2008 e pela incapacidade europeia de orquestrar uma resposta, o governo socialista, minoritário, que entretanto tinha saído das eleições legislativas de 2009 acabou a praticar um programa de austeridade mais intensivo que assumiu os traços mais dramáticos no paef. 

Portanto, o ps sempre defendeu e praticou as políticas de austeridade inspiradas nos tratados europeus e mais ou menos impostas pela comissão europeia e pela Alemanha por um lado, e pelo pensamento económico, científico e académico, predominante, por outro. Mais: as alternativas do ps às medidas do paef, independentemente das correntes internas em que estão filiadas (seguristas, costistas, socratistas), apresentam três grandes traços: primeiro, distinguem-se pela intensidade das medidas de austeridade e de ajustamento, em segundo, pela adesão a soluções do tipo messiânico (ex.: Hollande) e em terceiro, pela semiótica que as acompanha, a qual traduz a contrariedade na sua aplicação. Dito de outra forma, o ps aplicará todas as medidas que a comissão europeia e a Alemanha indicarem, sob protesto, contrariado e utilizando um vocabulário mais sofisticado.

O partido comunista (e o bloco de esquerda, já agora) nunca aplicaria um programa de austeridade como aquele que está contido no paef/memorandum. A austeridade teria de ser estendida aos grupos económicos, instituições bancárias e detentores dos contratos das parcerias público-privadas. Por isso, o pcp nunca terá de assumir as suas opções políticas a partir de um lugar de poder, porque nunca assumirá as responsabilidades governativas. Tem a vida facilitada: pode continuar a resistir a partir de uma posição de superioridade moral perante o povo. Mas esta posição não terá qualquer consequência prática.

O povo português já percebeu o que está em causa e votou nas últimas eleições em conformidade. O que seria verdadeiramente diferente neste contexto histórico seria criar as condições políticas para reestruturar a dívida pública portuguesa e dos países do sul da europa mantendo simultaneamente políticas de austeridade de elevada intensidade, mas justas do ponto de vista distributivo. 

Para as gerações actuais e futuras, é absolutamnete necessário a obtenção de resultados orçamentais nulos ou positivos e, simultaneamente, a reestruturação da dívida pública através de uma aproximação multilateral ou bilateral. Em alternativa, temos a saída do euro que continuará a exigir políticas de austeridade violentas e capacidade política superlativa.

Em resumo, as elites políticas e económicas portuguesas deveriam estudar de forma mais racional a actual posição de Portugal no mundo e rejeitar, tanto a assimilação acrítica dos pontos de vista do directório europeu, como a bonomia das soluções fáceis, ou facilmente vendáveis.                               

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