A
História de Portugal não é um tempo que nos sirva de exemplo. Quando os
portugueses, cada vez menos frequentemente, diga-se, procuram referências
naquilo que nos aconteceu no passado como sociedade, encontram muito poucas
justificações para as opções estratégicas actuais.
Este
país é, por estes dias, o país das reformas estruturais. O país em que se projectam
e realizam mudanças na estrutura da sociedade com o objectivo de obter melhorias
sociais e económicas.
Recuando
cinco a seis décadas, e sem preocupações de precisão histórica, encontramos os
partidos socialistas e sociais-democratas ou democratas-cristãos a reivindicarem
a mesma proposta histórica. Portugal, como país democrático, só após o 25 de
Abril entrou nesse debate, que parecia eterno, entre a reforma e a revolução.
Na Europa, e em Portugal, venceu a reforma. E a reforma supostamente mudou a
sociedade e tornou-a mais justa: saúde, educação e emprego como direitos
humanos assegurados de forma universal (tendencialmente) por serviços públicos
e leis inclusivas. A liberdade económica dos mercados seria (era) regulada de forma activa através
de intervenções específicas em sectores estratégicos, em doses e posologias
variáveis. Em resumo, a economia subordinada aos princípios sociais e
políticos.
Este
é o exemplo de uma mudança estrutural nas economias e nas sociedades, efectuado
através de forças políticas e sociais reformistas, não revolucionárias. Outros
exemplos são a transformação de uma economia de subsistência numa economia
industrializada ou a transformação de uma economia mista regulada numa economia
liberalizada, com o predomínio das forças do mercado sobre as decisões políticas
e económicas. Outra mudança estrutural actualmente em curso na economia mundial
é a globalização.
As
reformas estruturais defendidas pelo sector político do centro-direita, na
Europa e em Portugal, que têm como paradigma as “mudanças na estrutura da sociedade
com o objectivo de obter melhorias sociais e económicas” não são mais do que um
movimento de contra-reformas na medida e que contrariam o sentido das reformas
estruturais do século XX. Aqui, o que quero salientar é apenas o carácter envelhecido
das contra-reformas (ditas reformas estruturais) e não a adequação das mesmas à
realidade social mundial.
O
movimento das contra-reformas (denominado das reformas estruturais) assume algumas
tendências major como a desprotecção e
desfavorecimento do factor trabalho na sua relação com o factor capital, a relativização do Estado como
organização que promove a redistribuição dos rendimentos através da garantia
universal do acesso à saúde, à educação, à justiça e à segurança. Na raiz mais
profunda deste movimento está uma convicção fundadora de que a promoção das
políticas de redistribuição económica tem efeitos prejudiciais na criação de riqueza
e na competitividade das economias a uma escala mundial.
Já
agora uma pequena reflexão sobre o dia de hoje: o “dia em que a troica deixou
Portugal”. Saiu, mas vai voltar semestralmente nos próximos vinte anos para
monitorizar as condições para o reembolso do empréstimo. Saiu, mas deixa aqueles
que quis ir além do programa de ajustamento económico e financeiro (o memorandum). Saiu, mas deixou este povo
de pessoas quiescentes. Saiu, mas deixou o país com uma dívida pública muito superior à que encontrou. Saiu, mas deixou um país com quarenta por cento de desemprego entre os jovens. Saiu, mas deixou a reforma do Estado por fazer. Saiu, mas deixou os mesmos interesses instalados de sempre. Saiu, mas deixou uma diferença maior entre classes de rendimentos sem horizonte para ser corrigida pela competência. Saiu, mas deixou os mesmos nepotismos de sempre. Saiu, mas ficou. Ou, se calhar, nunca cá esteve. Estivemos sempre nós ou alguns de nós por nós.
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